abelardo

algum tempo depois fui entender do que se tratava.
uma história já há muito contada,
que antes de ter sido novamente concretizada,
já havia sido programada.

meio ao amor, angústia e desespero, recorto:

"How happy is the blameless vestal's lot!
The world forgetting, by the world forgot.
Eternal sunshine of the spotless mind!
Each prayer accepted, and each wish resigned;
Labour and rest, that equal periods keep;
"Obedient slumbers that can wake and weep;"
Desires composed, affections ever even,
Tears that delight, and sighs that waft to Heaven.
grace shines around her with serenest beams,
And whispering angels prompt her golden dreams."


volte noite

acordei em um lugar estranho, não lembrava de ter dormido fora.
ao me levantar, quase chutei dois grandes quadros de vidro que estavam encostados na parede e no chão.
fui até a cozinha e não hesitei ao pegar um pote bege e aguado com um queijo branco dentro,
comi um, dois pedaços, o celular estava sem bateria.
na parede, um relógio quadrado, torto, que só pra me ajudar não continha os números.
na cabeça, os flashes de carros e casas diversas, e os corpos e a falta de rostos.
posso ter sido violada, mas só comecei a sentir o corpo doer depois de cogitar tal possibilidade.
uma voz ecoa no fundo da casa,
entre palavras que eu já não entendo, talvez francês, talvez grego.
me alivia ser uma voz feminina, mas se eu pensar bem, percebo que não conheço nenhuma francesa e nem sequer grega.
foi uma noite fria, eu me lembro disso, mas o dia amanheceu num sol ardente e desesperador.
vesti o salto alto, quase dez centímetros, e torci para lembrar de alguém igualmente alto, mas não.
vestido colado, de manga comprida, preto - calor.
o portão estava fechado e eu pulei.
acho que é domingo, não tem ninguém por aqui.
melhor eu encontrar uma farmácia para garantir qualquer coisa.

beijo espelho

o problema é que quando você encosta em mim eu acho que é merecido, e pra merecer só pode ser porque você é parte de mim, transvestido de corpo e mente, provocando dentro de mim as maiores obsessões, eu narciso, do outro lado do espelho.
beijo espelho.
lentamente sugados por uma areia movediça de pó e poeira, que deturpa o próprio reflexo.
denovo:
"você sempre acha que está ficando maluca"
"dessa vez é sério..."